A discussão sobre o alcance da imunidade tributária prevista no art. 149, §2º, I, da Constituição Federal ainda gera embatidas tanto na esfera administrativa, como na judicial.
A matéria foi apreciada no bojo do Recurso Extraordinário nº 759.244 (Tema nº 674,), quando o Supremo Tribunal Federal deliberou sobre a incidência de contribuição social sobre as receitas decorrentes de exportações, quando realizadas de forma indireta, ou seja, efetuadas por intermédio de “trading companies”, considerando a imunidade ínsita no inciso I do § 2º do art. 149 da Constituição Federal.
Na ocasião, o Pretório Excelso, entendeu que “a norma imunizante contida no inciso I do § 2º do art. 149 da Constituição da República alcança as receitas decorrentes de operações indiretas de exportação caracterizadas por haver participação negocial de sociedade exportadora intermediária”.
Apesar de ficar reforçada a imunidade, eis que o ordenamento jurídico brasileiro favorece o comércio exterior, desonerando o objeto (receitas de exportação do bem ou do serviço), não do sujeito passivo (exportador), alcançando, portanto, tanto às exportações diretas, como as indiretas, fato é que a União ainda manifesta resistência quanto ao entendimento firmado pelo Judiciário.
Ao analisar a Solução de Consulta nº 149, de 24 de julho de 2023, a Receita Federal do Brasil entendeu pela incidência das contribuições sociais devidas por produtor rural pessoa física sobre a receita bruta decorrente de exportações realizadas por “trading companies”, se o valor foi despendido por cooperativa por ocasião da entrega dos produtos em depósito, por se tratar de operação mercantil.
De acordo com a Receita Federal do Brasil, a discussão sobre as operações comerciais realizadas entre cooperados e cooperativas deverá ser enfrentada quando do julgamento do Recurso Extraordinário 672.215 (Tema 536), que deliberará sobre “a possibilidade de lei dispor sobre a incidência, ou não, de COFINS, PIS e CSLL sobre o produto de ato cooperado ou cooperativo em face dos conceitos constitucionais relativos ao cooperativismo: ‘ato cooperativo’, ‘receita da atividade cooperativa’ e ‘cooperado’”.
O entendimento da Receita Federal do Brasil está equivocado. Isso porque o Tema 536, do Supremo Tribunal Federal irá delimitar a incidência ou não de COFINS, PIS e CSLL sobre o produto de ato cooperado ou cooperativo em âmbito nacional, não no caso de exportação, como submetido à consulta.
Diante da constatação de uma antinomia, ao buscar os métodos de interpretação em caso de aparente conflito de normas, à luz da Lei de Introdução às normas do Direito Brasileiro, deve se prestigiar a norma especial, em detrimento da geral.
Assim, uma vez que em caso de exportação se aplica o inciso I do § 2º do art. 149 da Constituição Federal, que segundo a interpretação do Supremo Tribunal Federal corresponde a uma imunidade tributária objetiva e não pessoal, deve alcançar o bem exportado indiretamente via “trading companies”, independentemente se a exportação é antecedida de relação entre produtor rural e cooperativa pois, repisa-se, deve-se focar no objeto, não na cadeia dos sujeitos envolvidos.
Nesse momento, impende salientar que reforçando o entendimento já pacificado pelo Pretório Excelso, o Tribunal Regional Federal da 3ª Região, quando instado a exercer ou não o juízo de retratação na Apelação Cível nº 0001734-29.2007.4.03.6108, após interposição dos recursos excepcionais, deu provimento ao agravo interno dos autores, a fim de reconhecer a imunidade de receitas decorrentes de exportações indiretas.
No voto proferido pelo relator, Exmo. Sr. Desembargador Federal Carlos Francisco, ficou restou consignado que “o exportador pessoa física que calcula o tributo combatido sobre o faturamento também tem direito ao benefício, pois essa imunidade tributária é objetiva e não pessoal, de modo que alcança o bem exportado indiretamente via “trading companies”, e não o contribuinte que dela se serve.
Assim, independentemente do produtor rural, segundo sua necessidade e facilidade, haja vista que o apoio de cooperativas é essencial para o escoamento da produção e obtenção de capital de giro, efetuar a exportação diretamente, mediante operação com cooperativa ou, ainda, através de “trading companies”, deverá ter resguardado seu direito à imunidade prevista no inciso I do § 2º do art. 149 da Constituição Federal, eis que é objetiva, alcançando o bem propriamente em si.
Logo, caso o exportador produtor rural pessoa física tenha seu direito à imunidade de suas receitas violado, seja diretamente ou pela operação de exportação de bem indiretamente via “trading companies”, ainda que precedida de operação com a cooperativa, caso comprove a relação jurídica subjacente, poderá se socorrer ao Judiciário para afastar a cobrança da contribuição prevista no art. 22-A, da Lei nº 8.212/1991.
Por Diego Szoke
Advogado Tributarista da Lopes & Castelo Sociedade de Advogados