Fábio Boni, especialista na área cível do escritório Lopes & Castelo Sociedade de Advogados. Artigo publicado no Estadão
O que vai garantir o êxito em uma demanda não é só a parte ter o “direito”, mas, também, vai demandar que todos os fatos, ou pelo menos os mais elementares, estejam devidamente provados nos autos.
É da praxe que o advogado, após ouvir a história do cliente, o questione sobre provas documentais ou testemunhais, que se fazem necessárias para comprovar em juízo tudo o que foi dito pelo cliente, mas, por vezes, não há nenhuma prova documental ou testemunhal.
Basicamente, o juiz é um terceiro que não presenciou os fatos e, portanto, leva em consideração aquilo que é contado nos autos, quando fundamentado em provas documentais ou testemunhais.
O artigo 373, do Código de Processo Civil, nos orienta que o ônus da prova incumbe ao autor, em relação ao fato constitutivo de seu direito e ao Réu, quanto à existência de fato impeditivo, modificativo ou extintivo do direito do autor.
É comum que muitas vezes os fatos se deem em uma conversa informal, como no caso de contratação por telefone de TV por assinatura ou INTERNET, em que o vendedor oferece informalmente a concessão de alguns benefícios, ou a possibilidade de desconto e, após o recebimento da fatura, descobre-se que tudo não passou de uma enganação.
Quando se tratar de relação de consumo, como acima informado, a questão é mais simples, o Código de Defesa do Consumidor facilita as coisas e inverte o ônus da prova, passando boa parte do ônus da prova para o fornecedor/fabricante.
Pois bem, o problema maior acontece quando não se tratar de relação de consumo, pois neste caso, não há inversão do ônus da prova (instituto que transfere o dever de provar um determinado fato à outra parte), aplicando-se a regra insculpida no artigo 373, do Código de Processo Civil, em que a prova incumbe ao autor, em relação ao fato constitutivo de seu direito e ao Réu, quanto à existência de fato impeditivo, modificativo ou extintivo do direito do autor
A questão é saber: A gravação telefônica por um dos interlocutores, sem o conhecimento do outro, pode servir como meio de prova?
Antes de responder a pergunta é bom trazer o conceito de prova definido pelo ilustre Professor Nelson Nery Junior, que traduz como meios processuais ou materiais considerados idôneos pelo ordenamento jurídico para demonstrar a verdade, ou não, da existência e verificação de um fato jurídico. (1997, P. 611)
Pois bem o Código de Processo Civil nos informa que as partes têm o direito de empregar todos os meios legais, bem como os moralmente legítimos, ainda que não especificados no Código, para provar a verdade dos fatos em que se fundamenta o pedido ou a defesa e influir eficazmente na convicção do juiz.
Nesse sentido, a realização da gravação de uma conversa telefônica por um dos interlocutores, sem o conhecimento do outro, torna a prova ilícita?
Veja, que neste caso, não estamos falando da interceptação telefônica, esta comumente utilizada em processos criminais, onde um terceiro (geralmente policial), mediante autorização judicial, “grampeia” a linha telefônica de determinado investigado e passa a escutar e gravar a conversa sem a ciência de ambos os interlocutores. Neste caso o fundamento é a prevenção e repressão de determinados crimes.
O caso debatido neste texto, um dos interlocutores sabe da gravação, e a grava apenas sem a ciência do outro interlocutor, com o propósito de já prevendo futura ação judicial, realizar a gravação da conversa e constituir prova.
O Supremo Tribunal Federal enfrentou a questão e vem decidindo em diversos precedentes de forma a considerar esse tipo de prova lícita, sendo firmado entendimento que a conversa gravada, mesmo sem o conhecimento do outro interlocutor, não necessita de autorização judicial e pode ser usada como prova em demandas judiciais.
Nesse sentido, é possível encontrar no mercado, diversos celulares compatíveis com aplicativo desenvolvido para gravar conversas telefônicas sem a ciência do outro interlocutor, constituindo importante avanço tecnológico à disposição das pessoas.
Portanto, pode-se concluir que a gravação de conversa telefônica, desde que ausente causa legal de sigilo, como no caso de conversa reservada entre psicólogo (a) e paciente, pode ser utilizada e juntada em processo judicial para comprovar os fatos alegado pelas partes, constituindo importantíssima fonte de prova na resolução das lides.