O Projeto de Lei (PL) 4728/2020, de autoria do senador Rodrigo Pacheco (DEM-MG), é mais uma medida discutida no Congresso Nacional, com impacto na área tributária, para o combate à crise econômica gerada pela Covid-19. O PL tem como objetivo reabrir o prazo de adesão ao Programa Especial de Regularização Tributária (Pert) até o dia 31 de dezembro de 2021 e traz novas possibilidades de parcelamento de dívidas fiscais, descontos de até 100% sobre juros e multas, além de prever a possibilidade de uso de créditos próprios, prejuízo fiscal e base de cálculo negativa para quitar os tributos em aberto. A adesão ao último Pert encerrou-se em outubro de 2017.
O projeto é visto com bons olhos por tributaristas, no entanto, há preocupação com a velocidade da tramitação do PL no Congresso. Até o momento não há relator. O senador Rodrigo Pacheco disse na sessão plenária do dia 21 de outubro que ainda deve levar o assunto na reunião de líderes.
Na análise de advogados consultados pelo JOTA, o texto proposto por Pacheco traz inovações importantes, entre elas a previsão de usar créditos próprios de impostos federais. “Por exemplo, o contribuinte tem créditos sujeitos à compensação porque pagou a mais por um imposto. Pelo projeto, em vez de a empresa pedir a restituição e fazer a compensação, ela pode pegar esse valor que pagou a maior e fazer a compensação no Pert”, explica Ana Lui, sócia da área de tributário do escritório Mattos Filho.
A possibilidade de usar prejuízo fiscal e base de cálculo negativa até o valor de R$ 15 milhões apurados até dezembro de 2019 também anima os tributaristas. Pelo PL, o prejuízo e a base de cálculo negativa a serem utilizados podem ser próprios da empresa que foi autuada ou do responsável tributário. Empresas controladas e controladoras também podem transferir os prejuízos fiscais, por exemplo, se a empresa-mãe tiver prejuízo, a empresa-filha pode aderir ao Pert e fazer uso desse prejuízo fiscal e da base negativa. “Isso é importante porque é uma moeda boa e não é dinheiro. Sem dúvida, é um alívio no caixa das empresas”, afirma Ana Lui, do Mattos Filho.
Ponderações
Se, por um lado, a medida tem o benefício de estimular o contribuinte ao pagamento de dívidas e facilitar a regularização fiscal, por outro, ela também pode “premiar” o contribuinte que não cumpre as suas obrigações fiscais regulares — mesmo tendo condições para isso — e se aproveita das condições especiais de negociação criadas pelo programa.
De acordo com Ana Cristina Mazzaferro, os programas de parcelamentos especiais têm como objetivo estimular o contribuinte ao pagamento de dívidas e facilitar a regularização fiscal. Para a Fazenda, o benefício consiste na entrada imediata de caixa, além de evitar custos de contencioso, avalia a tributarista.
“Entretanto, por outra perspectiva, os programas de parcelamento recebem muitas críticas porque acabam sendo vistos como uma forma de comodidade aos contribuintes, que por muitas vezes deixam de pagar tributos de forma regular para depois se valerem de benefícios decorrentes dos programas”, acrescenta a tributarista.
Segundo o tributarista Rodrigo Maito da Silveira, sócio do Dias Carneiro Advogados, há discussões no sentido de que esse tipo de benefício premia o mau contribuinte, ou seja, aquele que não cumpre as suas obrigações fiscais tempestivamente. Entretanto, ele avalia que apesar de um “potencial desequilíbrio concorrencial”, não é possível caracterizar esse tipo de ação como uma infração à ordem econômica.
“Seja como for, em um momento em que tanto os entes políticos quanto os contribuintes passam por dificuldades, esse tipo de programa reflete um esforço recíproco para regularização de pendências fiscais e aumento de arrecadação”, afirma o advogado.
Outras ponderações sobre o PL trazidas por tributaristas são quanto à limitação de R$ 15 milhões de prejuízo fiscal e a dúvida se as empresas do Simples poderão ser contempladas ou não pelo PERT.
“A maioria das empresas estão no Simples e não há previsão expressa no PL de que o parcelamento possa ser utilizado por esse grupo de empresas. Se é verdade que todos estão sofrendo, os pequenos têm capacidade menor de resistência financeira, eles podem perecer mais rapidamente, por isso, é importante que isso esteja claro no projeto”, avalia Renato Aparecido Gomes, tributarista do escritório Gomes, Almeida e Caldas.
Regras
De acordo com o texto do PL, o programa abrange os débitos de natureza tributária e não tributária – por exemplo multas aplicadas por órgãos de fiscalização, como Ibama e Procon – vencidos até 31 de agosto de 2020. A proposta parlamentar permite incluir dívidas anteriores rescindidas ou ativas em discussão administrativa ou judicial. A adesão ao Pert ocorrerá por meio de um requerimento a ser efetuado até o dia 31 de dezembro de 2020.
Segundo o PL, quanto menor o parcelamento, maior o desconto em multas e juros. Assim, a proposta prevê redução de 90% dos juros de mora e de 100% das multas de mora, de ofício ou isoladas em caso de pagamento em parcela única. Além disso, oferece parcelamento em até 140 vezes mensais, a partir de junho de 2021, com redução de 80% dos juros de mora e de 50% das multas de mora, de ofício ou isoladas.
Outra possibilidade prevista no PL é o parcelamento em até 175 vezes com redução de 50% e de 25% das multas de mora, de ofício ou isoladas. No Pert aprovado em 2017, o pagamento em parcela única tinha a possibilidade de redução de multas em 70%.
Também há opções para a utilização de créditos de prejuízo fiscal e de base de cálculo negativa da CSLL e de outros créditos ordinários próprios relativos aos tributos administrados pela Secretaria da Receita Federal do Brasil. O PL também possibilita que a Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional (PGFN) aceite bens imóveis para quitação do saldo remanescente.
Justificativa
Na justificativa apresentada no projeto, o senador Rodrigo Pacheco afirma buscar uma “solução imediata para mitigar a dramática situação das empresas” durante a crise gerada pela Covid-19.
“Ocorre que o impacto fiscal dessas medidas é de grande monta e é nosso dever, igualmente, procurar soluções que aumentem a arrecadação de modo a equilibrar as perspectivas orçamentárias. Assim, devemos retomar as medidas de crescimento econômico”, escreve o parlamentar.
Para o senador, o programa terá como consequência incentivar o pagamento de débitos tributários e não tributários, cuja credora é a União, “gerando um pico de liquidez nos próximos anos”.
“Assim, entendemos que o programa amplia a perspectiva de arrecadação no futuro próximo, o que será de absoluta necessidade para que o Brasil possa retomar o crescimento econômico o mais rápido possível”, concluiu o parlamentar no PL.
Medidas tributárias e o futuro
Desde o começo da pandemia gerada de Covid-19, o governo federal publicou uma série de medidas tributárias como forma de combater as consequências econômicas da crise.
As medidas incluem o adiamento da data de recolhimento dos tributos federais, como IRPJ, CSLL, PIS, Cofins e contribuições previdenciárias.
“Ainda assim, tais medidas adotadas atacam apenas o momento imediato, de urgência, e não possuem preocupações efetivas com as consequências dessa grave crise decorrente da pandemia”, afirma a tributarista Carolina Novello.
Uma das preocupações das empresas, avaliam advogados, é o passivo tributário que terá de ser pago após a crise. O crescimento econômico do país nos próximos anos — ou a falta dele — se refletirá na capacidade dos contribuintes de arcar com as dívidas contraídas.
Por Alexandre Leoratti e Flávia Maia
Fonte: jota.info