Não configuração de ato administrativo. Prescrição. Efeitos de decisões na jurisdição penal trancando ações intentadas para apurar os mesmos fatos.

Ementa:

01 – Não pratica ato administrativo considerado violador da lei de improbidade administrativa o advogado que, no exercício das funções do cargo de Assessor Jurídico de Município, emite parecer simplesmente opinativo em processo de licitação.

02 – A conduta do advogado, Assessor Jurídico de pessoa jurídica de direito público, que emite parecer opinativo em processo administrativo licitatório não configura ato de improbidade administrativa e, consequentemente, não viola o art. 10, I, da Lei n. 8.249, de 1992.

03 – De acordo com as regras do nosso ordenamento jurídico não é possível ser questionado no cível, mesmo em sede de Ação de Improbidade Administrativo, fatos que, no campo penal, por decisão transitada em julgado, foram considerados como não caracterizando consumação de ilegalidade.

04 – Ações Penais trancadas reconhecendo a ausência de justa causa para a sua interposição, em razão dos fatos narrados na denúncia não constituírem atos ilícitos contra a Administração Pública, projetam os seus efeitos, obrigatoriamente, no cível quando a pretensão consiste em considerar esses mesmos fatos como ilícitos administrativos.

05 – Não comete o ato de improbidade administrativa descrito no inciso I, do art.10, da Lei 8.249, de 1992, o Assessor Jurídico de pessoa jurídica de direito público que emite parecer opinativo.

06 – O ato de improbidade administrativa conceituado no inciso I, do art. 10, da Lei n. 8.249, de 1992, exige, para a sua consumação, que o agente haja, de modo comprovado, de modo doloso, causando dano ao erário.

07 –  É informe a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça na exigência da presença do dolo devidamente comprovado para caracterizar a consumação de ato de improbidade administrativa.

08 – A Ação de Improbidade Administrativa é meio processual para ser aplicado o Direito Administrativo Sancionador, pelo que é regida pelos princípios da legalidade, da impessoalidade, da prova real e da obediência ao rito fixado pela lei.

09 – O ordenamento jurídico brasileiro está pacificado no entendimento de que, para a configuração dos atos de improbidade administrativa há necessidade de haver o preenchimento dos seguintes requisitos: (a) conduta ilícita; (b) improbidade do ato, configurada pela tipicidade do comportamento, ajustado nos arts. 10 ou 11 da LIA; (c) elemento volitivo, consubstanciado no dolo específico de cometer a ilicitude e causar prejuízo ao Erário – admitindo-se, excepcionalmente, a modalidade culposa no art. 10; (d) dano efetivo ao ente estatal (art. 10 da LIA), sendo dispensado de comprovação, caso a conduta seja enquadrada no art. 11 da Lei mencionada, que exige tão somente ofensa aos princípios da Administração Pública.

10 – É relevante acentuar que a postura adotada pela  jurisprudência quanto ao parecer jurídico não ser ato administrativo tem sua base na circunstância de que o advogado parecerista não tem qualquer vinculação com os atos de gestão administrativa, não assume qualquer responsabilidade de prestar contas, não participa da arrecadação da verba pública, não firma qualquer contrato relativo a obrigações assumidas pela União, Estados, Municípios, Distrito Federal e pessoas jurídicas da administração indireta.

11 – O atuar do advogado, como assessor jurídico, na simples emissão de parecer, atendendo solicitação de agentes público, não se enquadra nas tipificações previstas pelo art. 10 da Lei de improbidade administrativa, pelo que inexiste justa causa para o Ministério Público intentar qualquer ação visando punição pelo estatuto legal agora referido.

12 – O parecer é conceituado, na opinião de PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Direito Administrativo. São Paulo: Atlas, 2007, p. 215. da forma seguinte:

– “Parecer é o ato pelo qual os órgãos consultivos da Administração emitem opinião sobre assuntos técnicos ou jurídicos de sua competência. O parecer é obrigatório quando a lei o           exige como pressuposto para a prática final do ato final. A obrigatoriedade diz respeito à solicitação do parecer (o que não lhe imprime caráter vinculante)”.

– “O advogado público, quando chamado a dar consulta jurídica nos autos de um processo administrativo, opina. Esta opinião é, na lição clássica de Hely Lopes Meirelles, um ato enunciativo, que não cria direitos e obrigações como sói acontecer no caso de um ato administrativo. Logo, o agente público que terá que decidir o caso submetido à consulta do advogado é que emitirá o ato administrativo de cunho decisório” (NOGUEIRA, Roberto Wagner Lima. O advogado parecerista e a Lei de Improbidade Administrativa, artigo publicado no sítio JusNavigandi, edição 1018: http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=8252.).

– Carvalho Filho distingue, na seara do Direito Administrativo, os atos opinativos dos atos decisórios, assinalando que:

– “Os pareceres consubstanciam opiniões, pontos de vista de alguns agentes administrativos sobre matéria submetida à sua apreciação. (…) Refletindo um juízo de valor, uma opinião pessoal do parecerista, o parecer não vincula a autoridade que tem competência decisória, ou seja, aquela a quem cabe praticar o ato administrativo final. Trata-se de direitos diversos – o parecer e o ato que o aprova ou rejeita. Como tais atos tem conteúdos antagônicos, o agente que opina nunca poderá ser o que decide” CARVALHO FILHO, José dos Santos. Manual de Direito Administrativo. Rio de Janeiro: Lúmen Júris, 2010, p.151.).

13 – Prescreve em 5 (cinco) anos, a contar da data em que o agente público deixa as funções do cargo de assessor jurídico, o direito de ser interposta ação para apurar o cometimento de suposta pratica de atos de improbidade administrativa.

14 – Desde que não exista qualquer prova de que o advogado agiu dolosamente, desvirtuando, por via de ação concreta, a aplicação da lei, não pode responder pela prática de ato de improbidade administrativa pelo fato de desempenhar atividade de consultoria e assessoria jurídica, privativa da advocacia, atuando, livremente, no exercício da profissão ao elaborar e emitir parecer jurídico em processo licitatório. Esse proceder está amparado pelo art.133 da Constituição Federal, o que deverá ser respeitado, de modo integral, por todos os Poderes.

15 – É lícito concluir que é abusiva a responsabilização do parecerista à luz de uma alargada relação de causalidade entre seu parecer e o ato administrativo do qual tenha resultado dano ao erário. Salvo demonstração de culpa ou erro grosseiro, submetida às instâncias administrativo-disciplinares ou jurisdicionais próprias, não cabe a responsabilização do advogado público pelo conteúdo de seu parecer de natureza meramente opinativa. Mandado de segurança deferido. (STF, MS 24631 / DF – DISTRITO FEDERAL, Tribunal Pleno, Min. JOAQUIM BARBOSA, Dje 09/08/2007)”.

16 – É dever do órgão acusatório, portanto, narrar de forma satisfatória a conduta delituosa atribuída ao agente, descrevendo todas as suas circunstâncias, conforme a norma disposta no artigo 41 do Código de Processo Penal, para que seja viável o contraditório a ser instituído em juízo.

17 – A doutrina e jurisprudência pátrias são pacíficas ao apontar os requisitos mínimos de uma peça acusatória, podendo-se citar, por todos, as lições de Ada Pellegrini Grinover, Antonio Scarance Fernandes e Antônio Magalhães Gomes Filho:

– “A instauração válida do processo pressupõe o oferecimento de denúncia ou queixa com exposição clara e precisa de um fato criminoso, com todas as suas circunstâncias (art. 41 do CPP), isto é, ‘não só a ação transitiva, como a pessoa que a praticou (quis), os meios que empregou (quibus auxiliis), o malefício que produziu (quid), os motivos que a determinaram a isso (cur), a maneira por que a praticou (quomodo), o lugar onde a praticou (ubi), o tempo (quando)’ (João Mendes Jr.). (As nulidades no processo penal. 11. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2009. p. 90-91.)

18 – Deve ser julgada extinta, em qualquer fase do processo, ação de improbidade administrativa em que a petição inicial não aponta ter o acusado praticado ato administrativo, nem ter agido com dolosidade, nem ter provocado dano à pessoa jurídica de direito público.

19 – Atua com abuso de direito o representante do Ministério Público que promove Ações de Improbidade Administrativa sem nenhum fundamento fático e de direito.

EMENTA DE PARECERES EMITIDOS POR JOSÉ AUGUSTO DELGADO (OBS.: A cópia de qualquer parecer abaixo indicado pela sua ementa pode ser solicitado ao autor pelo e-mail: (pareceres@lopescastelo.adv.br) (JOSÉ AUGUSTO DELGADO: Advogado. Parecerista. Professor. Consultor Jurídico. Ministro aposentado do Superior Tribunal de Justiça.

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