Entrevista para o LexLegal. Leia a íntegra
Nos últimos anos, a presença de aplicativos de mensagens como WhatsApp e Telegram se tornou central na comunicação entre pessoas e empresas. Essa realidade também chegou ao Poder Judiciário. Conversas, áudios e imagens trocados nessas plataformas passaram a ser frequentemente utilizados como provas em processos civis, criminais e trabalhistas. Mas até onde é possível utilizar esse tipo de material sem violar o direito à privacidade? E em que situações a Justiça entende que provas obtidas por aplicativos de mensagens são lícitas ou ilícitas?
A discussão não é simples. A Constituição Federal brasileira, em seu artigo 5º, inciso XII, garante a inviolabilidade das comunicações, salvo por ordem judicial, no âmbito de investigação criminal ou instrução processual penal. Ao mesmo tempo, o inciso LVI do mesmo artigo estabelece que “são inadmissíveis, no processo, as provas obtidas por meios ilícitos”. A tensão entre esses dois princípios – privacidade e busca da verdade – está no centro do debate sobre a utilização de conversas de aplicativos como provas.
Prints, áudios e mensagens: o que é aceito como prova?
Em processos judiciais, é comum que as partes apresentem prints de telas de conversas como forma de comprovar fatos. Porém, os tribunais alertam que capturas de tela isoladas podem ser frágeis, já que é possível adulterar mensagens com edições simples. Por isso, a Justiça passou a valorizar outros mecanismos que atestam a autenticidade do material, como a juntada do arquivo original extraído do aplicativo, a análise dos metadados (informações técnicas como data, hora e número de origem) e a cadeia de custódia digital.
Áudios enviados por aplicativos de mensagens também podem ser admitidos como prova, desde que não tenham sido obtidos de forma clandestina ou sem autorização. A jurisprudência entende que gravações feitas por um dos participantes da conversa são válidas, já que não há expectativa de sigilo em relação ao próprio interlocutor. Por outro lado, gravações feitas por terceiros, sem o conhecimento de nenhum dos envolvidos, podem ser consideradas ilícitas.
Em ações trabalhistas, por exemplo, já houve decisões em que prints de mensagens de WhatsApp serviram para comprovar jornadas de trabalho excessivas ou ordens abusivas de empregadores. Em processos de família, conversas foram usadas para provar alienação parental, ameaças ou abandono. Em investigações criminais, grupos de mensagens serviram como indícios de organização de crimes.
Casos em que provas de aplicativos foram rejeitadas
Embora sejam comuns, nem sempre provas extraídas de aplicativos são aceitas pela Justiça. Isso ocorre principalmente quando se comprova que o material foi obtido de forma ilícita. Um exemplo recorrente é o acesso a contas de WhatsApp ou Telegram sem autorização do titular. Se a prova é fruto de invasão de dispositivo ou quebra de senha, ela pode ser desconsiderada.
Em 2019, o Superior Tribunal de Justiça (STJ) decidiu que prints de conversas apresentados sem a possibilidade de verificação da cadeia de custódia não poderiam ser utilizados como única prova de um crime. A decisão reforçou que, para garantir a autenticidade, é necessário que os arquivos originais sejam disponibilizados para perícia, ou que haja outros elementos corroborando a informação.