Em que pese a relação de locador e locatário pareça, em um primeiro momento, uma relação consumerista, uma análise mais profunda e específica demonstrará o contrário. O primeiro ponto a se analisar diz respeito ao conceito de consumidor e fornecedor, cuja as definições estão respectivamente nos artigos 2° e 3° da lei 8.078 de 1990, o Código do Consumidor. Suas redações dispõem:
Art. 2° Consumidor é toda pessoa física ou jurídica que adquire ou utiliza produto ou serviço como destinatário final.
Art. 3° Fornecedor é toda pessoa física ou jurídica, pública ou privada, nacional ou estrangeira, bem como os entes despersonalizados, que desenvolvem atividade de produção, montagem, criação, construção, transformação, importação, exportação, distribuição ou comercialização de produtos ou prestação de serviços.
Atentando-se a realização do negócio jurídico em comento, que significa dizer, a celebração de um contrato de locação de um imóvel diretamente entre o locador e o locatário, não há uma consonância do mencionado ato com o que o legislador fez constar nos artigos supramencionados. Primeiramente, há de se observar que o locatário não está adquirindo um serviço ou um produto, mas tão somente está sendo cedido, a titulo oneroso, o uso de um imóvel. Ademais, analisando o artigo 3° do CDC, verifica-se também que o locador não está desenvolvendo nenhuma das atividades mencionadas no referido artigo. Logo, pela literalidade da lei, chega-se à conclusão que a relação de locador e locatário não se caracteriza como uma relação consumerista. Diferente seria, se a locação fosse feita por intermédio de uma imobiliária. Nessa hipótese, o Código do Consumidor incidiria sobre a relação de locação, eis que haveria uma prestação de serviço especializada.
Ademais, é de suma importância ressaltar, e esse ponto é o mais relevante para embasar o argumento da não aplicabilidade do CDC aos contratos de locação de imóveis urbanos, é justamente a existência de um diploma que disciplina especificamente a locação desses imóveis. Para isso, a lei 8.245 de 1991 trata da locação de bens imóveis residenciais, não residenciais e por temporada. Além dessa lei, tivemos um aperfeiçoamento do referido diploma, com o advento da lei 12.112 de 2009. Vale registrar que esta última não revogou a primeira, mas apenas complementou-a.
Nesse mesmo sentindo, a jurisprudência é pacífica a respeito do tema, vejamos a decisão proferida em sede de agravo regimental:
DIREITO EMPRESARIAL. AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. CONTRATO DE LOCAÇÃO FIRMADO POR SOCIEDADES EMPRESÁRIAS. INAPLICABILIDADE DO CDC. 1. A jurisprudência do STJ é firme ao negar a aplicação das normas do CDC aos contratos de locação, uma vez que estes são regulados por lei própria, a Lei n. 8.245/1991. 2. No caso em questão, tem-se um contrato locatício firmado por duas sociedades empresárias, cujo objeto era o aluguel de um espaço que seria usado pela locatária para exercício de sua atividade-fim – realização de eventos. Não há, definitivamente, como enquadrar tal contrato no conceito de relação de consumo. 3. A decisão agravada não interpretou cláusula contratual nem reexaminou o conjunto fático-probatório dos autos, mas apenas reconheceu, apoiada em vários precedentes do STJ, a tese jurídica de que o CDC não se aplica a contratos de locação. 4. Agravo regimental desprovido.
(STJ – AgRg no AREsp: 41062 GO XXXXX/XXXXX-9, Relator: Ministro ANTONIO CARLOS FERREIRA, Data de Julgamento: 07/05/2013, T4 – QUARTA TURMA, Data de Publicação: DJe 13/05/2013)
Essa decisão trata de duas pessoas jurídicas que celebraram o contrato de locação sem o intermédio de um serviço especializado, afastando assim, a aplicação da legislação do CDC. O Ministro ressalta justamente a impossibilidade de enquadramento do caso concreto à legislação de que trata a lei 8.078 de 1990, justamente por não preencher os requisitos que tratam os artigos 2° e 3° da mencionada lei. Sendo em assim, em se tratando de contrato de locação, cuja a celebração seja realizada diretamente entre o locador e o locatário, sem o intermédio da oferta de um serviço especializado, fica afastada a aplicação da legislação do Código do Consumidor.
Por Brenda Lima
Assistente paralegal da Lopes & Castelo Sociedade de Advogados