O Brasil deverá bater o recorde de investigações antidumping neste ano e tornará obrigatória a aplicação de sobretaxa provisória no prazo de quatro meses para frear importações com preços supostamente desleais. Assim, protegerá a indústria nacional já durante o exame do caso e não apenas ao fim de um processo, que dura 15 meses atualmente.
O número de petições de abertura de investigação antidumping dobrou no ano passado, alcançando cem pedidos até o Natal, em comparação com 55 em 2010, refletindo a preocupação da indústria nacional com o acirramento da concorrência barata estrangeira em meio à crise econômica global.
Além disso, 2012 também será particular na ação da defesa comercial no Brasil porque haverá a revisão de 20 sobretaxas antidumping que já são aplicadas. E a tendência é de que muitas delas resultem na manutenção da taxa. “Tudo nos leva a bater outro recorde na defesa comercial”, afirmou Felipe Hess, diretor do Departamento de Defesa Comercial (Decom) do Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior (MDIC).
O Brasil foi apontado em 2011 como o país mais protecionista entre as 20 maiores economias do mundo pela Câmara de Comércio Internacional (CCI). Na Organização Mundial do Comércio (OMC), também há preocupação com o acirramento de forças protecionistas no país. A questão não é exatamente com o uso dos instrumentos de defesa comercial, como o antidumping ou medidas compensatórias (contra subsídios embutidos no produto estrangeiro). E sim com mais medidas de política industrial que enveredam pelo comércio, como a exigência de conteúdo nacional.
De seu lado, Hess é enfático. “Não estamos inventando nada, não tem nada de ilegal. O que estamos fazendo é utilizar os instrumentos multilaterais para proteger nossa indústria do comércio desleal.”
Ele argumenta que, apesar de mais ação de defesa comercial, o volume de comércio afetado representa apenas 3% das importações. “O número é muito pequeno. Se pegarmos o volume de importações, a cada mês o Brasil importa mais do que no mês anterior. O Brasil não está se fechando.” Globalmente, as medidas protecionistas até o momento atingem 0,6% do comércio, segundo a OMC.
Em 2011, o Brasil encerrou 33 investigações contra produtos com preços supostamente desleais, o dobro de 2010, e 17 terminaram com sobretaxa contra o produto estrangeiro. O Decom tem 35 investigações em curso e 86 sobretaxas aplicadas. Dessas, 35 são contra produtos originários da China. As indústrias têxteis e de máquinas são as que mais reclamam proteção contra a concorrência estrangeira. Mas é o setor químico o mais beneficiado com aplicação de antidumping contra importações.
Para Felipe Hess, há muita coisa acontecendo na defesa comercial no Brasil que vai bem além das estatísticas. Ele diz que o compromisso do governo de Dilma Rousseff é ilustrado no plano Brasil Maior. Uma das medidas reduziu o prazo de investigação para defesa comercial de 15 para dez meses. Outra baixou o prazo das determinações preliminares de antidumping de 240 dias para 120 dias. O empresariado argumentava que o país demorava muito a proteger a indústria nacional.
Para implementar as duas medidas, o governo fará duas coisas neste ano. A primeira é criar 120 cargos de investigadores de defesa comercial. Hoje, são apenas 29 e com isso o país já está no limite da capacidade do que dá para cada um fazer. O edital para o concurso sairá no começo do ano.
Além disso, o governo vai modernizar e alterar a legislação antidumping. Uma das inovações é tornar obrigatória a determinação preliminar nas investigações antidumping. Ou seja, o Decom será obrigado a adotar sobretaxa provisória contra o produto em investigação no prazo de 120 dias. Já está havendo uma transição. Em 2010, o Decom não aplicou nenhuma sobretaxa provisória. Em 2011, aplicou 18.
Felipe Hess passou o fim de ano trabalhando no novo decreto, em plenas férias no interior de São Paulo. O decreto atual, de 1995, tem 72 artigos. Já a última versão do futuro texto tem 170 artigos e deve sair no fim do mês, ajustando muita coisa que hoje causa confusão e ineficiência para proteger a indústria nacional contra concorrência desleal.
Segundo Hess, até fevereiro também surgirá o “Decom digital”. As partes interessadas numa investigação vão acessar eletronicamente todo o processo, submeter os documentos etc. Isso acelera o processo e reduz os custos financeiros. O Decom vai fazer consulta pública a partir de janeiro também para alterar o decreto de legislação sobre salvaguardas e medidas compensatórias (antissubsídios).
Assis Moreira – De Genebra