Companhias de navegação e estaleiros têm obtido importantes precedentes na Justiça e em tribunais administrativos para afastar a cobrança do Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI) e Imposto de Importação (II) relativa a peças e componentes importados destinados ao reparo de embarcações. Por lei, essas mercadorias possuem direito à isenção, desde que preencham certos requisitos. A Receita Federal, porém, exige para conceder a benesse a comprovação da inexistência de produtos similares nacionais.

Decisões recentes do Tribunal Regional Federal (TRF) da 2ª Região, com sede no Rio de Janeiro, e da Delegacia da Receita Federal de Julgamento (DRJ), em Florianópolis (SC), deram vitória aos contribuintes. São precedentes relevantes porque companhias do setor têm sofrido autuações milionárias, segundo o advogado Eduardo Kiralyhegy. De acordo com ele, a decisão do TRF da 2ª região é a primeira de segunda instância que se tem notícias. “Esse julgamento pavimenta o caminho para um resultado favorável às empresas”, diz.

A decisão dos desembargadores foi unânime para negar provimento ao recurso da União. Dessa forma, foi mantida a sentença favorável a um estaleiro naval, que teve um auto de infração anulado. A empresa tinha importado em janeiro de 2012 dois resfriadores de fabricação holandesa para serem instalados em uma embarcação brasileira. Porém, foi intimada a comprovar a inexistência de produto similar nacional para obter a licença de importação emitida pelo Departamento de Operações de Comércio Exterior (Decex). Sem comprovação, foi autuada pela Receita Federal.

As companhias alegam que a Lei nº 8.032, de 1990, que trata de isenção do Imposto de Importação, e a Lei nº 9.493, de 1997, que concede isenção do IPI, não exigem a comprovação de inexistência de produto similar nacional. Segundo a defesa das companhias, o parágrafo 6º do artigo 150 da Constituição é claro ao dizer que a isenção de imposto só será concedida mediante lei específica, como ocorre no caso.

A Fazenda Nacional, por sua vez, argumenta no processo que a determinação para a comprovação de que não existem produtos nacionais semelhantes está expressa no artigo 118 do Regulamento Aduaneiro ao tratar das isenções previstas no Decreto-lei nº 37, de 1966.

Na recente decisão da 4ª Turma do TRF-2, o relator, desembargador Luiz Antonio Soares, entendeu que “não há necessidade de comprovação de inexistir similar no mercado nacional para fins de não incidência do imposto de importação, uma vez que não se pode fazer ressalvas, quando a própria lei que concede a isenção não o faz”.

Procurada pelo Valor, a Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional (PGFN) informou por nota que ainda não foi intimada da decisão do TRF. “Após a devida intimação, deverão ser examinadas as providências processuais adequadas, não sendo descartada a interposição dos recursos cabíveis”, diz a nota.

Em consequência dessa discussão, em setembro de 2012, o Sindicato Nacional das Empresas de Navegação Marítima (Syndarma), que reúne 48 empresas do setor, obteve liminar no TRF da 1ª Região, com sede em Brasília, para impedir que a Receita imponha essa condição para a liberação de mercadorias importadas. Segundo Kiralyhegy, que também representa o sindicato, a decisão ainda está em vigor e o processo está concluso para sentença. Contudo, as companhias continuam sendo autuadas por fatos que ocorreram antes e depois da obtenção da liminar. Neste último caso, os autos de infração ficam com efeitos suspensos até decisão definitiva. “Essa condição de inexistência de produto similar nacional nunca existiu. Até que a Receita Federal mudou seu entendimento e as empresas passaram a conviver com o fantasma de poderem ser autuadas pelas suas importações”, diz.

Os contribuintes ainda ganharam um caso favorável na 1ª Turma da Delegacia da Receita Federal de Julgamento (DRJ) em Florianópolis (SC). Em julgamento ocorrido em abril, todos foram unânimes a favor do cancelamento de uma autuação de cerca de R$ 6 milhões sofrida por uma empresa do setor. Para o advogado da companhia, Marcelo Carvalho Pereira, “a decisão deve servir de paradigma para outros casos. Até porque é o reconhecimento da própria Receita Federal de que não há que se falar em similaridade porque a legislação específica não previu”. A decisão contudo, manteve parte da autuação sofrida pela empresa porque a companhia não conseguiu comprovar que a mercadoria importada foi usada exatamente na embarcação alegada. “Sob esse aspecto tem sido mais penoso produzir essas provas”, diz.

O tributarista Eduardo Kiralyhegy ressalta que por se tratar de uma decisão da DRJ de Florianópolis, para onde são encaminhados todos os processos que envolvam tributos sobre o comércio exterior, “as chances de decisões similares em casos ainda pendentes de análise são muito grandes”.

Por Adriana Aguiar

Fonte: Valor Econômico

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