A base de cálculo da comissão do representante comercial é um tema que suscita diversas discussões no âmbito jurídico, especialmente no que se refere a possibilidade de descontar da base de cálculo os impostos contidos na nota fiscal, objetivando que a comissão seja calculada apenas sob o valor líquido da mercadoria. A jurisprudência brasileira tem se debruçado sobre esta questão, oferecendo interpretações que orientam a prática empresarial e contratual. Este artigo busca analisar o entendimento dos tribunais brasileiros sobre o tema e os riscos envolvidos.
Entendimento da Jurisprudência Brasileira
A base de cálculo da comissão do representante comercial, conforme estabelecida pela Lei nº 4.886/65, deve considerar o valor total das vendas realizadas pelo representante. Entretanto, surgem questionamentos sobre se impostos constantes na nota fiscal (como ICMS, ISS, IPI) devem ser incluídos ou excluídos desta base de cálculo.
A jurisprudência brasileira tem se posicionado majoritariamente no sentido de que os valores referentes a impostos devem compor a base de cálculo da comissão do representante comercial. O principal argumento é que o art. 32, §4º da Lei nº 4.886/65 – Lei de Representação Comercial -, prevê que as comissões do representante comercial deverão ser calculadas pelo valor total das mercadorias, ou seja, aquele constante na Nota Fiscal, incluído os impostos demais taxas que eventualmente constem na referida nota. In verbis:
Art. 32. O representante comercial adquire o direito às comissões quando do pagamento dos pedidos ou propostas. […]
§ 4° As comissões deverão ser calculadas pelo valor total das mercadorias.
Em decisões como a proferida pelo Superior Tribunal de Justiça, no REsp 1.162.985/RS, a relatora Ministra Nancy Andrighi, esclarece que “a lei não faz distinção, para os fins de cálculo da comissão do representante, entre o preço líquido da mercadoria – excluídos os tributos -, e aquele pelo qual a mercadoria é efetivamente vendida e que consta na nota fiscal”.
Em continuação, mencionando Carlos Alberto Hauer de Oliveira, a Relatora, complementa que:
“a base de cálculo das comissões deve necessariamente ser o valor total das mercadorias (art. 32, §4º), o que restringe a possibilidade de as partes preverem a melhor sistemática para a justa remuneração, impedindo, p.ex., que se deduzam da base de cálculo despesas determinadas, tais como alguns tributos, frete, embalagem, mesmo que haja suficiente justificativa econômica para tal”.
Neste mesmo sentido, seguem outros julgados do Superior Tribunal de Justiça:
“COMERCIAL. REPRESENTAÇÃO COMERCIAL. COMISSÃO. LEI Nº 8.420/1992, ART. 32, § 4º. BASE DE CÁLCULO. IPI. INCLUSÃO. PREÇO FINAL DO PRODUTO. 1 – Nos termos do artigo 32, § 4º, da Lei nº 8.420, de 8 de maio de de 1992, que introduziu modificações na Lei n. 4.886, de 9 de dezembro de 1965, diploma que regula as atividades dos representantes comerciais autônomos, “as comissões deverão ser calculadas pelo valor total das mercadorias”. 2 – A melhor interpretação a ser conferida ao aludido dispositivo é no sentido de que a comissão deve ser calculada com base no preço da mercadoria no momento da venda intermediada pelo representante, o que corresponde ao valor total do produto até essa fase da comercialização. 3 – Sendo o IPI imposto indireto, assim como outros tributos que integram a composição do preço da mercadoria na saída do estabelecimento industrial e comportam repasse pela sociedade empresária industrial representada aos adquirentes, não poderá ser abatido da base de cálculo da respectiva comissão devida ao representante comercial que intermediou a operação mercantil. 4 – Recurso especial a que se nega provimento.” (Resp nº 756.115/MG, 4ª Turma, Rel. Min. Raul Araújo, DJe 13/02/2012).
CIVIL E PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO INTERNO EM RECURSO ESPECIAL. AÇÃO DE COBRANÇA. CONTRATO DE REPRESENTAÇÃO COMERCIAL. COMPLEMENTAÇÃO DE COMISSÃO. BASE DE CÁLCULO.
1. Ação de cobrança de diferenças de comissões de representação comercial.
2. A jurisprudência desta Corte perfilha entendimento segundo o qual o valor das mercadorias a que faz referência o art. 32, § 4º, da Lei 4.886/65 – e que serve como base de cálculo para o cálculo da comissão devida ao representante comercial – corresponde ao valor dos produtos no momento em que realizada a venda, considerando-se o preço lançado na nota fiscal, nele incluídos o valor dos tributos e qualquer outros que tenham constado da nota fiscal, como, eventualmente, o frete. (AgInt nos EDcl no REsp n. 1.755.097/PR, Rel. Min. Nancy Andrighi, Terceira Turma, julgado em 2/12/2019, DJe de 5/12/2019.)
Portanto, ainda que conste expressamente no contrato a possibilidade de exclusão do valor dos impostos e outras taxas da base de cálculo, referida cláusula seria considerada ilegal e abusiva, uma vez que viola diretamente o art. 32, §4º, da Lei n.º 4.886/65, bem como contraria a jurisprudência dos Tribunais, inclusive, do Superior Tribunal de Justiça.
Riscos
A tentativa de utilizar, para base de cálculo da comissão do representante comercial, um valor diverso do total indicado na nota fiscal, como, por exemplo, o valor líquido da mercadoria sem os impostos e outras despesas a ela relacionadas, poderá acarretar riscos à Representada, uma vez que os Representantes comerciais poderão promover ação judicial, alegando violação legal, objetivando o recebimento da diferença das comissões decorrentes do desconto indevido, além da aplicação de rescisão por justa causa, garantindo-lhe o direito ao recebimento da indenização correspondente a 1/12 das comissões devidas durante a vigência contratual, nos termos do artigo 27-j da Lei de Representação Comercial.
Conclusão
Sendo assim, é prudente que as Empresas ajustem seus contratos de representação comercial de modo a atender a Legislação e o entendimento do Superior Tribunal de Justiça, mitigando, assim, os riscos de ter-se aplicada a justa causa pelo Representante e a propositura de ação judicial.

Natália Rech
Advogada Contratual e Societária pela Lopes & Castelo Sociedade de Advogados