Há uma grande preocupação da legislação em proteger o salário e as verbas a ele equiparadas, já que se trata de uma verba essencial para o sustento do indivíduo e de sua família.
Nesse sentido, o art. 833, IV e § 2º, do Código de Processo Civil de 2015 prevê regra de impenhorabilidade do salário.Vejamos o disposto na lei:
Art. 833. São impenhoráveis:
IV – os vencimentos, os subsídios, os soldos, os salários, as remunerações, os proventos de aposentadoria, as pensões, os pecúlios e os montepios, bem como as quantias recebidas por liberalidade de terceiro e destinadas ao sustento do devedor e de sua família, os ganhos de trabalhador autônomo e os honorários de profissional liberal, ressalvado o § 2º ;
§ 2º O disposto nos incisos IV e X do caput não se aplica à hipótese de penhora para pagamento de prestação alimentícia, independentemente de sua origem, bem como às importâncias excedentes a 50 (cinquenta) salários-mínimos mensais, devendo a constrição observar o disposto no art. 528, § 8º , e no art. 529, § 3º . – grifo nosso
Contudo, essa regra sempre gerou grandes discussões no mundo jurídico acerca do equilíbrio entre dois importantes princípios decorrentes da dignidade da pessoa humana: (i) o direito ao mínimo existencial do devedor e o (ii) direito à satisfação executiva do credor.
Ao passo que alguns juristas defendem a impenhorabilidade como forma de garantia do “mínimo existencial” necessário à dignidade humana do devedor, outros observam que o montante de 50 salários mínimos (que atualmente corresponde a R$ 82.000,00), se mostra muito dissonante da realidade brasileira, cuja média salarial é, atualmente de R$ 3.123,00.[1]
Diante dessa questão, alguns julgados do Superior Tribunal de Justiça vinham admitindo, excepcionalmente, a penhora salário abaixo do limite de 50 salários mínimos, quando observadas as peculiaridades do caso concreto.
Através de recente decisão da Corte Especial do Superior Tribunal de Justiça, houve o julgamento dos Embargos de Divergência 1.874.222/DF, onde a maioria dos integrantes da Corte votou para autorizar a penhora de salário abaixo dos 50 salários mínimos, desde que inviáveis outros meios executórios e reservado o “mínimo existencial” do devedor.
Nesse sentido foi o voto do Ministro Relator João Otávio de Noronha, que asseverou que “a fixação desse limite de 50 salários mínimos merece críticas, na medida em que se mostra muito destoante da realidade brasileira, tornando o dispositivo praticamente inócuo, além de não traduzir o verdadeiro escopo da impenhorabilidade, que é a manutenção de uma reserva digna para o sustento do devedor e de sua família.”.
Conclui-se, portanto, que houve um importante avanço para a uniformização da matéria, contudo, não será esgotada enquanto não houver uma definição de parâmetros objetivos para a autorização da penhora de salário, que, por ora, segue sendo autorizada de acordo com a análise do caso concreto.
[1] https://valor.globo.com/brasil/noticia/2024/04/30/ibge-renda-media-sobe-15percent-e-massa-de-rendimentos-atinge-novo-recorde-no-trimestre.ghtml
Por Jaqueline de Oliveira Bento
Advogada Cível pela Lopes & Castelo Sociedade de Advogados