Em recente decisão proferida pelo Plenário do Supremo Tribunal Federal – STF, por maioria de votos, ficou reconhecida a constitucionalidade da majoração, pelo Poder Executivo, das alíquotas das contribuições ao PIS à COFINS incidentes sobre as receitas financeiras percebidas por pessoas jurídicas enquadradas no regime não-cumulativo.
A decisão foi proferida no julgamento simultâneo do Recurso Extraordinário RE n.º 1043313 (Tema 939 de Repercussão Geral), e da Ação Direta de Inconstitucionalidade ADI n.º 5277.
A discussão teve como cerne a possibilidade de as alíquotas da contribuição ao PIS e à COFINS serem reduzidas e restabelecidas por regulamento infralegal, nos termos do art. 27, § 2º, da Lei n. 10.865/2004.
No regime não cumulativo, a base de cálculo da COFINS está prevista no artigo 1º, caput e §1º, da Lei nº 10.833/2003, assim como acontece com a base de cálculo da contribuição ao PIS prevista no artigo 1º, caput e §1º, da Lei nº 10.637/2002.
No final do terceiro mês de vigência da Lei nº 10.865/2004, o Poder Executivo, invocando a faculdade prevista no §2º do artigo 27 da mencionada Lei, editou o Decreto nº 5.164, de 30 de julho de 2004, para reduzir a 0 (zero) “as alíquotas da Contribuição para o PIS/PASEP e da Contribuição para o Financiamento da Seguridade Social – COFINS incidentes sobre as receitas financeiras auferidas pelas pessoas jurídicas sujeitas ao regime de incidência não cumulativa das referidas contribuições”, salvo as receitas oriundas do pagamento de juros sobre capital próprio e aquelas decorrentes de operações de hedge.
Em meados de 2005, o Decreto nº 5.164/2004 foi revogado pelo Decreto nº 5.442/2005, também editado com fundamento no §2º do artigo 27 da Lei nº 10.865/2004, por meio do qual foram mantidas em 0 (zero) as alíquotas das contribuições referidas acima no que tange às receitas financeiras, sem excepcionar, dessa vez, as receitas decorrentes de operações de hedge.
Este último Decreto, por sua vez, vigorou até 1º de abril de 2015, momento em que foi revogado pelo Decreto nº 8.426/2015, por meio do qual foi majorada para 0,65% (sessenta e cinco centésimos por cento) a alíquota da Contribuição ao PIS incidente sobre receitas financeiras e para 4% (quatro por cento) a alíquota da COFINS incidente sobre a mesma modalidade de receita, salvo as exceções ali previstas.
Nesse cenário, a bem da verdade, o mencionado Decreto nº 8.426/2015 verdadeiramente definiu as alíquotas da contribuição ao PIS e da COFINS sobre receitas financeiras – tendo em vista, repita-se, que a lei definiu apenas os limites de alíquota aplicáveis –, majorando o tributo sem lei que o defina, em evidente afronta ao princípio da legalidade (artigo 5º, inciso II, c.c. artigo 150, inciso I, ambos da Constituição Federal), verdadeira limitação ao poder de tributar e direito fundamental do contribuinte.
O restabelecimento da alíquota se deu através de Decreto, o que acabaria por violar de forma frontal à redação prevista no art. 150, I, da Constituição da República, assim como o art. 97, II, do Código Tributário Nacional.
Isto porque, em que pese o Decreto n.º 8.426/15 dispor que se tratava de um “restabelecimento”, conforme autorização prevista no art. 27, § 2º, da Lei nº 10.865/04, o que o Decreto efetivamente fez foi majorar as alíquotas das contribuições PIS e COFINS, que até então eram zeradas e passaram a ser somadas, de 4,65%.
Ou seja, a tributação das receitas financeiras pelo PIS e pela COFINS seria inexigível pela ofensa direta da Lei 10.865/05 (art. 27, §2º na expressão “restabelecer”) e seu Decreto nº 8.426/15 ao princípio da Legalidade, insculpido no art. 5º, II, da Constituição da República, bem como o Princípio da Estrita Legalidade Tributária do art. 150, I, da Constituição da República e 97, II, do Código Tributário Nacional.
Contudo, no recente pronunciamento da Suprema Corte, prevaleceu o entendimento do relator dos dois processos, ministro Dias Toffoli, que afirmou que a orientação de que a legalidade tributária imposta pelo texto constitucional não é estrita ou fechada vem sendo reiterada pelo STF.
Ressaltou, no entanto, que essa flexibilização deve observar certos requisitos. No caso das alíquotas da contribuição ao PIS e à COFINS essas exigências teriam sido respeitadas na edição da Lei 10.865/2004.
Assim, de acordo com o ministro Toffoli, não há que se falar em inconstitucionalidade na possibilidade de o Poder Executivo alterar alíquotas das contribuições, devendo, no entanto, observar a regra da anterioridade nonagesimal prevista no artigo 150, inciso III, alínea ‘c”, da Constituição Federal.
Foi fixada a seguinte tese de repercussão geral: “É constitucional a flexibilização da legalidade tributária constante do § 2º do art. 27 da Lei nº 10.865/04, no que permitiu ao Poder Executivo, prevendo as condições e fixando os tetos, reduzir e restabelecer as alíquotas da contribuição ao PIS e da COFINS incidentes sobre as receitas financeiras auferidas por pessoas jurídicas sujeitas ao regime não cumulativo, estando presente o desenvolvimento de função extrafiscal”.
O julgamento foi finalizado sob a sistemática da repercussão geral, de modo que referido entendimento será utilizado em casos semelhantes a serem julgados pelo Poder Judiciário.
Por Thiago Sanchez Thomaz
Departamento Tributário Lopes & Castelo Sociedade de Advogados