A Meta, detentora do Instagram, Facebook, WhatsApp e outras empresas anunciou, em maio, o tratamento de dados de usuários brasileiros para o desenvolvimento e treinamento de sua inteligência artificial no Brasil, inicialmente restrita ao Facebook e Instagram.
O uso de dados seria restrito a perfis públicos, englobando fotos, vídeos e legendas de posts, deixando de lado mensagens privadas trocadas entre usuários.
O objetivo deste tratamento era desenvolver, a partir dos dados dos usuários, um modelo de inteligência artificial que pudesse aprimorar respostas automáticas no bate-papo, possibilitar traduções de posts para o usuário com um clique, permitir a criação de fotos e vídeos gerados por inteligência artificial diretamente na plataforma e outras funcionalidades.
Um dos problemas percebidos na iniciativa, desde o começo, foi a falta de transparência. Embora a Meta tenha feito constar em seus termos de privacidade a possibilidade do tratamento, nenhum aviso foi dado aos usuários brasileiros (ao contrário do que aconteceu na Europa), e também não foi dado, de maneira transparente, o direito de se opor a este tratamento.
Na plataforma, o direito de se opor a este tratamento até existia, mas estava desnecessariamente dificultado, a 8 cliques e longos textos de distância da página inicial. Ainda assim, mesmo superando os obstáculos, o cumprimento do direito não era automático, estando sujeito à análise por parte de pessoas ou setores da Meta sobre os quais nenhuma informação é fornecida.
As opções para o usuário que não desejassem que seus dados fossem utilizados, enfim, não eram muitas. O usuário poderia mudar sua conta para o tipo privada, seguir a jornada pelos termos da Meta para opor-se ao tratamento, sem garantia de sucesso ou simplesmente encerrar sua conta, deixando de participar das redes sociais.
No caso, a Meta alega que o uso das postagens para aprimoramento de sua IA é um interesse legítimo da empresa e da sociedade, sendo desnecessária a concordância dos usuários.
Com base em tudo que foi exposto, a Autoridade Nacional de Proteção de Dados, ANPD, emitiu em 02/07/2024, ordem de suspensão imediata do tratamento realizado pela Meta, sob pena de multa diária de 50 mil reais.
Em sua decisão, a ANPD alega que a justificativa legal apresentada pela Meta para o tratamento dos dados, o legítimo interesse da empresa e da sociedade, não é adequada, visto que os direitos das pessoas físicas não estão sendo respeitados com essa hipótese.
Alega também que a Meta não é transparente quanto ao tratamento: as pessoas não são informadas sobre o que, como e quando seus dados estão sendo tratados. A política de privacidade da Meta, onde o tratamento é citado, não explicita corretamente todos os pontos do tratamento, como manda a LGPD.
Adicionalmente, a ANPD pontua que o direito de oposição ao tratamento, embora existente, é desnecessariamente dificultado pela Meta, estando escondido em longos textos e muitos cliques, o que propositadamente dificulta que as pessoas exerçam seus direitos.
Por fim, diferentemente do que ocorreu na Europa, onde a Meta avisou seus usuários que não seriam utilizados dados de crianças e adolescentes, aqui no Brasil não há qualquer restrição ou aviso por parte da empresa, o que viola as diretrizes sobre tratamento de dados de menores da LGPD.
Desse modo, prevalece a Autoridade Nacional de Proteção de Dados na defesa dos direitos dos cidadãos brasileiros. Cabe ressaltar que exatamente o mesmo se deu na Europa, com a determinação de suspensão dessas atividades. Agora, a Meta terá de reformular suas atividades e termos se quiser tratar os dados de brasileiros para sua Inteligência Artificial.
Por Thiago Bento dos Santos
Advogado Digital pela Lopes & Castelo Sociedade de Advogados