No mundo pós pandemia, podemos verificar a existência de novos costumes sociais cada vez mais relacionados com o mundo virtual. Se no passado os encontros virtuais eram raros, hoje em dia eles acabam pro preencher nossa agenda.
E assim como os encontros, a realização de negócios por meios virtuais também acabou por ganhar força e recorrência.
Se no passado exigia-se encontros pessoais para assinatura de Contratos, durante a Pandemia fomos obrigados a firmar Contratos via WhatsApp que, muitas vezes, foram considerados anuídos com o simples ‘ok’ das partes.
Passada a fase crítica da Pandemia, percebeu-se que muitas formalidades anteriormente cumpridas não faziam mais sentido para o momento vivenciado pela sociedade.
Dessa forma, presenciamos cada vez mais contratos sendo firmados via WhatsApp, sem a existência de assinaturas digitais ou de testemunhas, sem que isso impeça o cumprimento das obrigações assumidas pelas partes.
No entanto, esse atual momento nos obriga a fazer alguns questionamentos, baseado na legislação que temos em vigor: serviria o contrato ou o negócio firmado via WhatsApp como título executivo extrajudicial?
Algumas são as discussões sobre o assunto e os que defendem que esse tipo de negócio não pode ser considerado como título executivo extrajudicial, toma-se como base, dentre outros argumentos, o disposto no artigo 784 do CPC, uma vez que não consta no seu rol os negócios firmados pelo meio virtual, além da inexistência de colheita de assinaturas das partes e testemunhas.
No entanto, alguns dispositivos legais podem trazer a ideia oposta, como, por exemplo, o disposto no artigo 5º, II da Constituição Federal (Princípio da Legalidade) e nos artigos 107 e 421 do Código de Processo Civil, bem como 425 do Código Civil. Veja:
- Artigo 5º, II da CF: “II – ninguém será obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma coisa senão em virtude de lei”;
- Artigo 107, que dispõe que: “A validade da declaração de vontade não dependerá de forma especial, senão quando a lei expressamente a exigir”;
- Artigo 421 e Parágrafo Único, que dispõem que: “A liberdade contratual será exercida nos limites da função social do contrato” e “Nas relações contratuais privadas, prevalecerão o princípio da intervenção mínima e a excepcionalidade da revisão contratual”;
- Artigo 425, que dispõe que: “É lícito às partes estipular contratos atípicos, observadas as normas gerais fixadas neste Código”.
Da leitura dos dispositivos acima, podemos verificar que as partes possuem liberdade para firmar o Contrato e que a forma com que ele foi realizado não depende de forma específica para ser considerado válido, desde que, obviamente, respeitados os requisitos de validade do Contrato previstos no artigo 104 do Código Civil.
E esse argumento possui ainda mais força quando o contrato surte os efeitos ali previstos, ainda que, em certo momento, surja a necessidade de litígio.
No entanto, apesar de tais considerações, registro que o mundo jurídico ainda não firmou posicionamento sobre o tema e, certamente, exigirá certo amadurecimento sobre essa nova realidade para que possamos ter algum direcionamento do Judiciário, principalmente quando envolve temas realizados virtualmente, em razão da presunção relativa de veracidade que possui.
De qualquer forma, o artigo 785 do Código de Processo Civil garante às partes, nessa situação debatida, o acesso ao Judiciário para que o negócio firmado via WhatsApp possua reconhecimento de título executivo extrajudicial.
Por Daniela Matos Simão
Advogada Contratual e Societária pela Lopes & Castelo Sociedade de Advogados