Investir em imóveis pode ser uma tarefa cheia de desafios: burocracias, custos elevados e processos de transações demorados. A tokenização imobiliária veio com a promessa de ser a solução para essas questões, quebrando barreiras e democratizando o mercado de imóveis.
A ideia é dividir um imóvel em pequenas frações digitais chamadas tokens, que podem ser comprados, vendidos e negociados em plataformas online, assim como ações na bolsa de valores.
Isso significa que, com um pequeno investimento inicial, você pode adquirir uma parte de um grande empreendimento e participar da valorização ou dos lucros provenientes, por exemplo, de aluguéis. Parece revolucionário? É porque realmente é.
Isso graças as tecnologias como o blockchain – que registra todas as transações de forma transparente e segura – e os smart contracts, ou contratos inteligentes, que automatizam as operações, eliminando intermediários.
O blockchain, que nada mais é do que um sistema que funciona como um grande livro contábil digital. Ele registra todas as transações de maneira definitiva, segura e transparente, sendo descentralizado. Fraudes e manipulações tornam-se impossíveis, onde cada token registrado no blockchain representa, de forma incontestável, uma fração legítima do imóvel.
Já os smart contracts, ou contratos inteligentes, vêm para complementar essa estrutura, neles todas as transações entre as partes são conferidas de forma automática e somente são validadas quando todos os termos do acordo são cumpridos.
A tokenização poderá resolver alguns problemas antigos do mercado imobiliário. Primeiro, ela democratiza o acesso: até quem tem pouco dinheiro pode participar de empreendimentos grandes, algo que antes era reservado apenas a quem tinha grandes fortunas. Em segundo lugar, ela traz maior liquidez. Hoje, vender um imóvel pode levar meses, até anos. Com os tokens, a negociação pode ser feita em minutos.
Além disso, empresários podem enxergar na tokenização uma forma de captar recursos com menos custos e de maneira mais ágil. É um modelo que, no papel, beneficia todo mundo: investidores, incorporadoras e até o mercado como um todo, que se torna mais dinâmico.
Mas e os desafios? Apesar do potencial, a tokenização ainda enfrenta vários obstáculos. Um deles é a integração com o sistema imobiliário brasileiro, que é altamente formal e centralizado. Hoje, tudo precisa passar pelos cartórios, que têm um papel importante, mas nem sempre são ágeis. Já o blockchain, por outro lado, é descentralizado e automatizado. Como unir esses dois mundos?
Outro ponto é a falta de regulamentação específica. Sem regras claras, como garantir que um token corresponde, de fato, a uma fração legítima de um imóvel? Quem fiscaliza isso? E, em caso de disputa, qual lei se aplica? Essas são questões que precisam ser respondidas antes que a tokenização imobiliária possa crescer de forma consistente no Brasil.
E também, há o desafio da tecnologia em si. Os smart contracts, por exemplo, são imutáveis. Isso é ótimo para evitar fraudes, mas pode ser um problema se houver algum erro ou se as condições mudarem. Corrigir um contrato digital pode ser tão ou mais complicado do que lidar com contratos tradicionais.
No Brasil, a Lei nº 14.478/2022, que regula ativos virtuais, já está em vigor, embora ela ainda não aborde diretamente os imóveis tokenizados, abre espaço para debates futuros.
A Comissão de Valores Mobiliários (CVM), que já reconhece que certos tokens podem ser enquadrados como valores mobiliários, dependendo de suas características e, está acompanhando de perto esse novo cenário. Recentemente, lançou a Consulta Pública nº 109/2024, que discute como regular plataformas de negociação de ativos digitais. Transparência, proteção ao investidor e segurança estão no centro das discussões. Outro aspecto a considerar é a tributação.
A Instrução Normativa nº 1.888/2019, da Receita Federal, exige que todas as transações envolvendo tokens sejam declaradas. Isso reforça a importância de alinhar a tecnologia à legislação fiscal para evitar surpresas desagradáveis.
Por enquanto, a tokenização ainda parece algo mais promissor do que consolidado. A tecnologia está disponível, sim, mas a aplicação prática no mercado brasileiro exige uma base jurídica sólida, adaptações nos sistemas de registro e, principalmente, mais clareza regulatória.
Sem isso, o mercado corre o risco de operar com incertezas, o que pode afastar investidores e até mesmo desestimular empresários que veem nesse modelo uma oportunidade.
Se você é empresário ou investidor, o momento é de observar e aprender. Entender como funciona a tokenização, acompanhar as discussões e buscar orientação são passos fundamentais para estar preparado quando essa inovação finalmente ganhar força por aqui.
A tokenização imobiliária pode ser o futuro do mercado, mas, como toda grande transformação, ela depende de cuidado, planejamento e tempo para amadurecer. Afinal, modernizar é necessário, mas segurança e confiança continuam sendo indispensáveis. E será que estamos prontos para essa revolução? O tempo – e as regulações – dirão.
Por Priscila Farias Cherubini
Advogada Cível pela Lopes & Castelo Sociedade de Advogados